Em casa, Tamara tem uma mala quase pronta. Basta fechá-la e correr para o aeroporto e pegar o voo para São Paulo. Os horários de cada companhia aérea e o melhor caminho até o hospital toda a família sabe de cor.
A correria é mais que explicada. Ao fim da viagem ainda sem data marcada, um pâncreas vai aguardar por ela, assim como a chance de recomeçar sua vida.
Douglas Marçal
Tamara se emociona com a atitude de Cézar: "É um gesto de amor".
Os doces, que as crianças comiam no colégio e nas festinhas, ficaram apenas na lembrança de Tamara, que descobriu ter diabete melitos tipo I aos 10 anos. A partir de então, abstenção total.
O controle da doença, caracterizada pela não produção da insulina que metaboliza a glicose, começou a ser diário, com injeções da substância.
Por 12 anos, a diabete de Tamara foi controlada, mas, em 2009, a doença se agravou. A jovem começou a passar muito mal. Estava com hipertensão.
A complicação comprometeu o funcionamento dos rins. Com insuficiência renal, ela começou a fazer sessões de hemodiálise 3 vezes por semana. Quando o braço se recupera das agulhadas para a retirada do sangue com toxinas e entrada do sangue limpo, logo vêm outras. Tamara passou a conviver com os esparadrapos.
Foi nessa época que a família encontrou o médico Marcelo Perosa, em São Paulo. A primeira pergunta dele foi sobre a possibilidade de transplantar um rim para que Tamara tivesse uma melhor qualidade de vida.
O rim é um dos únicos órgãos que podem ser retirados de um doador vivo. A procura começou com o pai, Cézar Gualberto, 52 anos. A cada novo exame, a compatibilidade ficava comprovada. Em uma das últimas consultas com o nefrologista, o médico, inclusive, escolheu o rim direito para o transplante.
Se dependesse de Cézar, a operação aconteceria o mais rápido possível, mas como Tamara é diabética, o médico aconselha que a cirurgia seja acompanhada de outro transplante, de pâncreas. Caso contrário, o rim doado poderia vir a falhar como os outros.
Tamara é a terceira da fila de espera por um pâncreas no Hospital Bandeirantes, em São Paulo (SP). Se precisasse entrar na fila por um rim, a espera poderia ser até seis vezes maior.
Com simplicidade e sorrisos, pai e filha contam a luta da família. A coragem do pai em se arriscar em uma cirurgia, sem hesitar, impressiona muita gente. Menos ele, que não entende a pergunta que os outros fazem: "Mas você não tem medo?"
"Ter medo do quê? Não consigo entender. Não tenho medo da morte, estou doando meu rim. Mas se pudesse, doaria meu pâncreas, até meu coração para ela. É que o médico não deixa. A única coisa que eu quero é ver ela bem. Não acho isso uma atitude nobre ou bonita ", diz Cézar. "Se eu tivesse essa oportunidade mil vezes, doaria meu rim todas as mil vezes para fazer Tamara feliz".
Tamara conta emocionada que se orgulha por tê-lo como pai. "Ele acha normal doar o rim para mim. Eu não acho. É a minha vida que está correndo risco e ele está tendo coragem para fazer isso por mim. É muito nobre, um gesto de amor".
A família Gualberto acordou anteontem com uma ligação que poderia ser a mais importante de suas vidas: a equipe médica do Hospital Bandeirantes tinha um doador de pâncreas compatível com Tamara. Ela e o pai foram para São Paulo enquanto outros testes eram feitos. No início da tarde, o transplante foi desconsiderado. O órgão havia sido afetado por uma hemorragia e não estava em boas condições para o transplante.
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