A jornalista Rose Leonel, 41 anos, venceu, esta semana, nova batalha na Justiça. Em 2006, ela foi vítima de crime cometido pelo ex-namorado que, inconformado com o fim do namoro, divulgou fotos da ex-companheira nua na internet .
O ex-namorado, empresário Eduardo Gonçalves da Silva, foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Paraná à pena de um ano, onze meses e vinte dias de detenção, que foi substituída por prestação de serviços comunitários e pagamento à Rose de R$ 1,2 mil ao mês pelo prazo correspondente à detenção. "A condenação foi libertadora", desabafa a jornalista.
Silva postou na internet fotos de sexo do casal, após o término do relacionamento de três anos e meio. Desde 2006, quando as primeiras imagens foram publicadas na rede, Rose luta na Justiça. As fotos foram enviadas para e-mails de centenas de maringaenses e foram parar em sites pornográficos da Rússia, Alemanha e Holanda.
Assim que as primeiras imagens caíram na internet, a vida de Rose virou de cabeça para baixo: perdeu o emprego, sofreu preconceito e decidiu que o melhor para o filho mais velho seria morar com o pai fora do Brasil. O drama vivido pela jornalista a incentivou a criar uma organização não-governamental para ajudar mulheres vítimas de crimes na internet.
"Ninguém passa por uma situação tão triste sem que isso não possa servir de experiência para ajudar os outros", diz.
"Qualquer um pode ser vítima de uma situação semelhante a essa. É muito fácil dizer: ‘Nossa, como a pessoa foi boba, imprudente’. O que fui, foi ser uma mulher apaixonada’’
"Quando aconteceu o crime, eu explicava tudo a eles (os filhos). Chorávamos e orávamos juntos. Por várias vezes nós ajoelhamos e choramos juntos, esperando uma providência divina’’
O Diário - Como você se sente com a condenação dada pela Justiça?
Rose Leonel - Sinto que foi feito Justiça, que a minha alma está sendo lavada, porque a sentença é um alívio moral para mim. Nada recupera o que foi perdido, mas é um alívio moral. Eu acompanhava o processo e no dia em que a sentença foi publicada os advogados me avisaram e a enviaram para o meu e-mail. Acho que não poderia (ter acontecido) de outra forma. Era uma coisa que eu queria muito. A condenação não representou vitória só para mim, mas para as mulheres. Esse tipo de crime deve acontecer com várias mulheres e quando vem uma punição desta natureza beneficia a todas elas. Isso se torna uma jurisprudência para outros casos para que outras mulheres em situação semelhante possam se encorajar e esperar que a Justiça seja feita.
O Diário - A sentença foi justa?
Rose Leonel - O que a Justiça determinou já é o início. Começou a ser feito Justiça no meu caso. É um alívio moral e fiquei contente com a condenação.
O Diário - Havia o receio de que ele não pagasse pelo crime que cometeu?
Rose Leonel - Perdi muitas coisas, mas não a fé em Deus. Sempre achei que essa situação seria resolvida mais cedo ou mais tarde. A gente tem que ter fé na Justiça, embora reclame e saiba que a Justiça no Brasil, às vezes, é complicada. Fiquei aliviada. É uma vitória também da minha família, porque o crime não ocorreu só contra mim, afetou meus pais e meus filhos. Minha família agora respira aliviada. Foi como se a minha vida tivesse sido roubada e agora eu estivesse retomando a minha vida. Eu não saí de Maringá, fiquei esperando para que a Justiça fosse feita. E agora eu estou livre. Essa condenação foi libertadora.
O Diário - Você teve perdas profissionais e pessoais. Depois de seis anos, você conseguiu recuperá-las?
É um crime irreparável e depois da condenação eu sinto que as coisas começam a melhorar e ficar mais claras. Os olhares começam a mudar porque as pessoas começam a entender, mas o preconceito ainda existe. Espero que a partir dessa condenação as pessoas passem a entender a situação de forma diferente. Espero recuperar o tempo perdido. Fui assassinada moralmente, profissionalmente, psicologicamente. Agora, começo a respirar e a viver de novo e espero recuperar as perdas que tive.
O Diário - O que mudou na reação das pessoas seis anos depois?
Rose Leonel - Os olhares e o tratamento. É muito fácil julgar os outros, só que agora, com a condenação, as pessoas começam a entender que eu fui vítima. Elas começam a entender que qualquer um pode ser vítima de uma situação como essa. É muito fácil dizer: ‘Nossa, como a pessoa foi boba, imprudente’. O que fui, foi ser uma mulher apaixonada. Qualquer mulher que vive uma relação estável tem que confiar (no parceiro). Quando você tem uma relação amorosa é claro que existe entrega. Quando a pessoa vive uma situação dessas ela é passível de ser traída. E foi o que aconteceu comigo. Foi uma traição e nada justifica uma traição como essa. Esse tipo de crime cometido na internet é hediondo, porque tira todas as possibilidades de vida social, amorosa e profissional (da vítima). É um crime que atinge todos os familiares de forma direta. É um crime cujas consequências são prolongadas. Têm vários desdobramentos e sequelas que a gente não consegue medir. Não é um crime que fica no passado porque a internet o mantém vivo, infelizmente. Quero que meus netos saibam que eu estava inocente nessa situação, que eu fui vítima e que lutei por Justiça não só por uma causa minha, única, mas por uma causa de todas as mulheres.
O Diário - Como as pessoas te julgavam na época?
Rose Leonel - Elas não me viam como vítima, embora eu fosse. Existia um preconceito e em vez de elas se voltarem contra o agressor, se voltaram contra mim. É muito triste, mas hoje começam a entender. Em momento algum eu pensei que uma situação dessa pudesse acontecer comigo. Você tem uma relação estável com uma pessoa e jamais imagina que ela possa se voltar contra você. Você não imagina que dorme com o inimigo.
O Diário - Ele divulgou as fotos íntimas por raiva com o fim do namoro?
Rose Leonel - Quando eu terminei o namoro, ele disse que faria isso. Ameaçou que se não ficássemos juntos, ele faria isso. As pessoas diziam que ele me amava demais e a relação entre amor e ódio é muito tênue. Eu não entendo esse tipo de amor. Quando se ama só se quer o bem, assim como eu o amei e só quis o bem dele. Você se doa e não espera nada em troca e jamais espera que aconteça alguma coisa diferente disso. Eu não consigo entender esse tipo de relacionamento. Isso não é amor, não pode ser.
O Diário - Nesse período, você encontrou com ele?
Rose Leonel - Tenho o amparo da Lei Maria da Penha e ele não pode se aproximar de mim a menos de 150 metros. A gente não tem contato algum e a única coisa que eu quero é passar logo por esse período e perdoar. Uma das coias que aprendi com isso foi o perdão.
O Diário - Então você o perdoou?
Rose Leonel - O exercício do perdão acontece diariamente. Quando perdia uma oportunidade de trabalho ou recebia um olhar discriminador eu pensava: ‘Poxa vida, isso foi por causa do crime que ele cometeu contra mim’. Daí, eu elaborava de novo: ‘É ruim, mas eu tenho que perdoar’.
O Diário - Falava com os seus filhos sobre o que acontecia?
Rose Leonel - Meus filhos acompanharam quando terminei o namoro com ele. Quando aconteceu o crime, eu explicava tudo a eles. Nós chorávamos e orávamos juntos. Por várias vezes, nós ajoelhamos e choramos juntos, esperando uma providência divina. Quando eu flagrei uma conversa dele, por e-mail, com o técnico de informática, procurei um advogado, que me orientou a fazer uma notificação. Eu esperava que ele não cometesse o crime porque se ele fizesse estaria assinando embaixo. Fiquei o fim de 2005 pedindo a Deus para que ele não fizesse isso. Ele assinou a notificação, mas disse que não tinha medo de nada.
O Diário - Como ficou sabendo da divulgação das imagens?
Rose Leonel - Estava em Foz do Iguaçu, de férias, e todo mundo começou a me ligar. Foi como se o chão tivesse saído dos meus pés. Fui para o quarto chorar e pedi para Deus uma luz. Ele mandou as fotos para e-mails de várias pessoas: empregadores, amigos, clientes, órgãos de comunicação e assessoria de políticos.
O Diário - Qual lição você tira dessa história?
Rose Leonel - Aprendi e amadureci muito. Aprendi sobre perdão, a entender as pessoas, convivi com muito preconceito. Era muito inocente e isso me obrigou a amadurecer e ser mais prudente.
O Diário - Você se privou de algo na época?
Rose Leonel - Amigos falavam: ‘Rose, não sai de casa’. Resolvi me resguardar e procurei apoio em Deus e na família. Um novo relacionamento estava fora de cogitação, porque eu sabia que os homens estavam interessados naquela situação vendida na internet. Aquela personagem que foi criada não era eu.
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